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Teodiceia sertaneja

By 22 de fevereiro de 2020 No Comments

Conversei com muitos sertanejos na minha recente viagem ao sertão do nordeste. Perguntei a eles quais obras e autores melhor traduziram a alma do agreste.

Luiz Gonzaga apareceu em todas as respostas. Tem gente que até hoje se emociona ao ouvi-lo.

O que fiz, após voltar ao Rio, tendo ouvido os testemunhos dos que atravessaram os duros anos de fome e seca, e que ainda enfrentam inúmeros obstáculos para vencer a pobreza que os assola?

Parei para ouvir a canção mais famosa do seu intérprete favorito. Confesso que jamais o havia feito. Senti vergonha por ser partícipe dessa parte da sociedade brasileira que historicamente ignorou o drama do sertanejo.

“Quando olhei a terra ardendo

Qual fogueira de São João

Eu perguntei a Deus do céu, ai

Por que tamanha judiação

Eu perguntei a Deus do céu, ai

Por que tamanha judiação

Que braseiro, que fornalha

Nem um pé de plantação

Por falta d’água perdi meu gado

Morreu de sede meu alazão

Por farta d’água perdi meu gado

Morreu de sede meu alazão

Até mesmo a asa branca

Bateu asas do sertão

Entonce eu disse, adeus Rosinha

Guarda contigo meu coração

Entoce eu disse, adeus Rosinha

Guarda contigo meu coração

Hoje longe, muitas léguas

Numa triste solidão

Espero a chuva cair de novo

Pra mim voltar pro meu sertão

Espero a chuva cair de novo

Pra mim voltar pro meu sertão

Quando o verde dos teus olhos

Se espalhar na plantação

Eu te asseguro não chore não, viu

Que eu voltarei, viu

Meu coração

Eu te asseguro não chore não, viu

Que eu voltarei, viu

Meu coração”.

Eis a síntese do sofrimento de um povo, que movido pela ânsia da sobrevivência foi parar no sul de um estranho país que falava a sua mesma língua.

A canção de Luiz Gonzaga demanda uma defesa dos procedimentos de Deus (teodiceia). Quem clama aos céus buscando compreender “tamanha judiação” deve obter como resposta da igreja a pregação do evangelho redentor do Cristo nu, sedento, torturado, abandonado, morto; seguida do amor que faz a justiça do reino de Cristo chover sobre a terra da sequidão.

Vejo o “varão sertanejo” clamando, “passa ao sertão”.

Antonio Carlos Costa

Antonio Carlos Costa

Teólogo, jornalista e ativista social. Plantador da Igreja Presbiteriana da Barra (Rio de Janeiro) e fundador da ONG Rio de Paz. Nascido no Rio de Janeiro em 1962. Casado com Adriany. Pai de três filhos: Pedro, Matheus e Alyssa.

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